11/07/2009

Porque marcho no sábado por José Soeiro


Desde a primeira hora, apoio a Marcha do orgulho LGBT do Porto. Este ano, voltarei à rua com a mesma vontade com que marchei pela primeira vez, juntando a minha voz à de tantos e de tantas que têm feito esta luta e esta festa nos últimos anos.

E faço-o por motivos simples, razões sensatas que deveriam interpelar todos quantos se reconhecem na defesa dos direitos humanos, da diversidade e da felicidade.

Marcho porque o amor, o desejo, a atracção, o afecto, são sempre razões de celebração e só uma sociedade sem decência pode tomá-los como motivos de ódio ou de rancor.

Marcho porque todos têm direito a todos os direitos, e não quero viver numa cidade ou num país ou num mundo em que há grupos de pessoas que, por gostarem de alguém, ou por lutarem pela sua identidade de género, são excluídos de direitos básicos: o direito à identidade, o direito ao casamento, o direito a constituir famílias, o direito a ter e a tomar conta dos seus filhos, o direito a sentir-se livre e andar à vontade no trabalho ou na rua.

Marcho porque quero que se olhem as pessoas para além do que têm entre as pernas, que se goste das pessoas para além do que têm entre as pernas, que se avalie as pessoas pelo que são. E porque o direito à indiferença precisa, para existir, que se afirme primeiro que existem muitas formas diferentes de amar e de sentir - e elas não são para ser escondidas dentro das paredes de casa ou das sociabilidades clandestinas, mas para ser vividas plenamente no espaço público como no privado.

Marcho porque um Estado que não age contra a violência homofóbica e transfóbica - nas escolas, nos hospitais, na polícia, nas ruas ... - é cúmplice dessa mesma violência, seja ela simbólica ou física. E como o Estado é a representação da nossa comunidade politica, é a ele também que devemos exigir um combate firme contra a discriminação e uma prevenção decidida da ignorância (que é, afinal, a base de todo o preconceito).

Marcho porque a questão de gays e lésbicas e bissexuais e transgéneros, como as questões dos nossos direitos enquanto homens e mulheres, enquanto trabalhadores, enquanto precários, enquanto pensionistas ou enquanto estudantes, não são questões individuais. Tratam-se de direitos colectivos, que implicam mobilização e organização, que implicam afirmação e conflito.

Marcho porque a discriminação LGBT acentua as outras discriminações: as mulheres lésbicas são ainda mais vulneráveis que as outras, os trabalhadores homossexuais estão mais frágeis face à discriminação e ao abuso dos patrões, os imigrantes LGBT sofrem de duplas e triplas discriminações e cada discriminação torna a nossa vida mais precária e menos livre. Marcho sempre, em todas as marchas, contra todas as discriminações e todas as formas de exploração económica e de opressão social.

Marcho porque nenhum direito social, nenhum direito económico, nenhum direito humano foi gentilmente outorgado pelo poder. Pelo contrário, toda a nossa história enquanto humanidade nos mostra que eles são reconhecidos se forem arrancados pela afirmação das vozes que tentam ser caladas e dos grupos que se tenta invisibilizar. Marcho pela visibilidade e porque a rua é um lugar privilegiado da luta social e política.

Marcho porque este é também um ano de eleições e, assim, de clarificação e de assunção de responsabilidades. Porque não calo a minha indignação com o chumbo do casamento pela maioria que governa o país. E porque é hora de dizer que todos têm de ser consequentes e claros nas suas escolhas.

Marcho porque, nesta como noutras coisas, vamos construindo afectos e compromissos. E não me sentiria bem se ficasse em casa sabendo que no dia 11 de Julho as ruas do Porto serão lugar de celebração da luta contra a discriminação. Marcho porque sei que é ai, nesse dia, o meu lugar. E o teu.

José Soeiro
http://www.esquerda.net/index.php?option=com_content&task=view&id=12666&Itemid=130

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